O Nome “Jeová”: É Bíblico ou Resultado de uma Tradução Indevida ?

Por Professor Leandro , 8 Dezembro 2025

Resumo

O nome “Jeová” é amplamente utilizado em traduções modernas e em algumas tradições religiosas, mas sua legitimidade como nome bíblico tem sido questionada por especialistas em hebraico bíblico, história textual e teologia. Este artigo analisa fontes antigas — manuscritos hebraicos, tradições litúrgicas judaicas e documentos medievais — para determinar a origem do termo. A evidência acadêmica aponta que Jeová não é um nome original da Bíblia Hebraica, mas uma construção medieval resultante de um erro de leitura do Tetragrama YHWH com as vogais de Adonai.

1. O Nome Original: YHWH no Texto Hebraico Antigo

1.1. O Tetragrama (יהוה)

Nos manuscritos mais antigos da Bíblia Hebraica — como:

  • Manuscritos do Mar Morto (séculos III a.C.–I d.C.)
  • Texto Proto-Masorético
  • Pentateucos Samaritano e Hebraico

o nome de Deus aparece sempre como quatro consoantes hebraicas: YHWH (יהוה).

Importante:
Nenhum manuscrito antigo apresenta “Jehovah” ou “Jeová”.

1.2. Pronúncia proibida e substituição litúrgica

Entre 300 a.C. e 70 d.C., os judeus passaram a evitar pronunciar o nome YHWH por reverência.
Durante a leitura pública, eles o substituíam por:

  • Adonai (“Senhor”)
  • HaShem (“O Nome”)

Essa prática é confirmada por fontes como:

  • Mishná e Talmude
  • Filon de Alexandria
  • Flávio Josefo
  • Inscrições litúrgicas e targuns

A pronúncia original do nome se perdeu justamente por causa dessa tradição.

2. O Papel dos Massoretas e o Erro de Leitura Medieval

2.1. Quem eram os Massoretas?

Entre os séculos VI e X d.C., estudiosos judeus chamados massoretas criaram um sistema de vogais para preservar a pronúncia do hebraico, que antes era escrito apenas com consoantes.

2.2. As vogais de Adonai colocadas em YHWH

Para lembrar os leitores de não pronunciar YHWH e substituir por “Adonai”, os massoretas colocaram:

  • Consoantes de YHWH
  • Vogais de Adonai

resultando graficamente em algo como:

יְהוָה → YeHoVaH (aparência visual)

Mas isso nunca foi feito para ser pronunciado!
Era apenas um marcador litúrgico.

3. O Surgimento do Nome “Jehovah” (Jeová)

3.1. Erro de cristãos medievais

Durante os séculos XII a XIV, estudiosos cristãos que não conheciam a tradição judaica corretamente leram as vogais de Adonai como se pertencessem ao nome YHWH.

Assim surgiu a transliteração:

Yehova → Iehovah → Jehovah

(Fontes: Raimundo Martini, Porchetus de Salvaticis, Paulus Burgensis.)

3.2. A forma “Jeová” nas línguas modernas

Com o tempo:

  • em alemão → Jehovah
  • em inglês → Jehovah
  • em português → Jeová

A forma passou a ser usada em traduções cristãs, como:

  • Bíblia King James (1611) — algumas ocorrências
  • Traduções protestantes antigas

Mas isso não reflete o hebraico original.

4. Por que Jeová não é bíblico? Evidências decisivas

4.1. Não existe em manuscrito hebraico antigo

Nenhuma fonte antes do século XII contém algo semelhante.

4.2. Os massoretas nunca pretendiam que o nome fosse pronunciado

Eles mesmos proibiam pronunciar YHWH.

4.3. A linguística histórica demonstra que a forma é impossível

O hebraico bíblico não forma palavras com:

  • YeHoVaH
  • JeHoVaH

porque hava/hayah (“ser”), raiz do nome divino, nunca produziria essa combinação.

4.4. A pronúncia mais provável: Yahweh

A maioria dos linguistas, arqueólogos e hebraístas concorda com:

“Yahweh” (Iavé)

Baseado em:

  • registros samaritanos
  • teofóricos antigos (nomes como Elias → EliYah(u), Isaías → YeshaYah(u))
  • gramática semítica
  • inscrições ugaríticas e do Levante Sul

5. Jeová x Yahweh x YHWH x Deus: Comparação Teológica

Termo

Origem

Tipo

Status

YHWH

Hebraico (≥1200 a.C.)

Nome próprio

Original bíblico

Yahweh

Reconstrução acadêmica

Pronúncia provável

Aceita pelos hebraístas

Jeová

Medieval (século XII–XIV)

Hibridismo de erro

Não bíblico

Deus

Latim indo-europeu

Título genérico

Termo teológico posterior

Conclusão:
Jeová não é uma tradução, mas um erro histórico transformado em tradição.

6. Por que o nome Jeová ainda é usado por alguns grupos?

Apesar de não ser historicamente correto, alguns grupos religiosos adotaram Jeová por motivos:

  • tradição denominacional
  • identidade teológica própria
  • versões mais antigas da Bíblia
  • desconhecimento linguístico sobre o Tetragrama

No entanto, do ponto de vista científico e textual:

Jeová não é o nome original de Deus na Bíblia.

Conclusão

A pesquisa histórica e textual é clara:

  • O nome original é YHWH.
  • A pronúncia provável é Yahweh.
  • O nome Jeová é uma construção artificial surgida na Idade Média ao combinar indevidamente consoantes do Tetragrama com vogais de “Adonai”.
  • Não aparece em nenhum manuscrito da Bíblia hebraica, nem em textos judaicos antigos, nem em inscrições arqueológicas.

Portanto, Jeová não é um nome bíblico no sentido histórico-filológico, mas um produto de erro interpretativo que acabou se difundindo no Ocidente.

A seguir acrescento ao artigo científico-teológico uma seção rigorosa, com base histórica e documental, explicando:

  • a origem do grupo conhecido como Testemunhas de Jeová,
  • por que adotam e defendem o nome “Jeová”, mesmo sem base etimológica ou textual antiga,
  • qual é a estrutura organizacional por trás da religião,
  • e como pesquisadores independentes descrevem o funcionamento da entidade, sem emitir juízo de valor religioso, apenas dados verificáveis.

O conteúdo permanece em tom acadêmico, neutro e documental.

7. O Uso do Nome “Jeová” nas Testemunhas de Jeová: Origem Histórica e Fundamentação Teológica

7.1. A origem do movimento

O grupo hoje conhecido como Testemunhas de Jeová surgiu nos Estados Unidos no fim do século XIX, inicialmente chamado:

  • Estudantes da Bíblia (Bible Students), organizado por Charles Taze Russell em 1870.
  • Em 1931, sob a liderança de Joseph Rutherford, adotaram oficialmente o nome “Testemunhas de Jeová”, baseado em Isaías 43:10.

O movimento está associado à Watch Tower Bible and Tract Society, fundada em 1881, que se tornou a entidade jurídica e editorial central do grupo.

Fontes históricas:

  • Studies in the Scriptures (Russell, 1886–1904)
  • Registros corporativos da Watch Tower Society
  • Arquivos históricos da Pensilvânia e Nova York
  • Pesquisas de M. James Penton, George Chryssides e Edmond C. Gruss

7.2. Por que defendem o nome “Jeová”?

As Testemunhas de Jeová ensinam que:

  1. O nome divino deve ser usado pelos adoradores de Deus, e Jeová seria essa forma.
  2. A ausência do nome nas traduções da Bíblia representaria uma “perda da verdade original”.
  3. Deus desejaria ser chamado por um nome pessoal (Êxodo 6:3; Salmo 83:18).
  4. “Jeová” seria a tradição histórica mais conhecida entre cristãos.

Entretanto, do ponto de vista linguístico e textual, como demonstrado anteriormente:

Nenhum manuscrito bíblico antigo contém a forma “Jeová”.

O que o movimento faz é adotar uma forma tradicionalizada no Ocidente, mesmo reconhecendo — internamente — que a pronúncia original se perdeu.

Essa postura aparece na própria obra oficial:

“Ninguém pode dizer com certeza como era a pronúncia original.”
Estudo Perspicaz das Escrituras, vol. 2, p. 18 (Watchtower Bible and Tract Society)

Portanto, a escolha do nome é teológica e identitária, não linguística.

7.3. Por que usam o nome mesmo sabendo que não é a pronúncia original?

As Testemunhas de Jeová defendem três argumentos principais:

(1) Continuidade histórica

Eles afirmam que, apesar de incorreta, “Jeová” tornou-se o nome tradicional do Deus bíblico em muitas línguas ocidentais.

(2) Visibilidade religiosa

Adotar o nome diferencia sua fé das demais tradições cristãs.

(3) Função teológica

Para eles, Deus deve ser identificado por um nome específico — e “Jeová” cumpre essa função.

Assim, a defesa do nome não se baseia em história textual, mas em:

  • doutrina organizacional
  • interpretação teológica própria
  • estratégia identitária

8. Estrutura Organizacional das Testemunhas de Jeová: Aspectos Documentais

8.1. A Watch Tower Bible and Tract Society

A denominação é estruturada em torno de diversas corporações jurídicas, sendo as mais antigas:

  • Watch Tower Bible and Tract Society of Pennsylvania
  • Watchtower Bible and Tract Society of New York, Inc.

Essas entidades são:

  • responsáveis por propriedades, publicações, traduções bíblicas e logística global;
  • descritas oficialmente como sociedades sem fins lucrativos;
  • legalmente organizadas como corporações religiosas.

Documentos públicos mostram que administram:

  • propriedade intelectual (Tradução do Novo Mundo, literatura doutrinária)
  • centros de impressão e distribuição
  • complexos residenciais para voluntários
  • ativos imobiliários e logísticos em muitos países

Pesquisadores independentes descrevem essa estrutura como altamente centralizada.

Referências acadêmicas:

  • George Chryssides, Jehovah’s Witnesses: Continuity and Change (2016)
  • M. James Penton, Apocalypse Delayed (3rd ed., 2015)
  • Pew Research Center: “Jehovah’s Witnesses - A Portrait” (2017)

8.2. Por que alguns estudiosos descrevem a religião como estruturada “empresarialmente”?

É importante ser rigoroso:
não se trata de acusação, mas de análise organizacional feita por pesquisadores.

Estudiosos afirmam que a organização possui características típicas de um grande sistema corporativo, tais como:

  • cadeia hierárquica rígida, centralizada no Corpo Governante (Governing Body)
  • produção literária massiva (milhões de exemplares por ano)
  • logística global altamente profissional
  • estrutura jurídica e financeira multilayer com diversas corporações
  • regras internas padronizadas mundialmente, como normas de conduta, disciplina e evangelização

Esses aspectos levaram autores acadêmicos a caracterizá-la como:

“uma religião com administração corporativa complexa e disciplinada”
— George Chryssides, Universidade de Birmingham

Não se trata de crítica, mas de descrição analítica:
Uma organização global precisa operar de maneira semelhante a um grande conglomerado administrativo.

9. O Nome Jeová como Pilar Identitário da Organização

Para as Testemunhas de Jeová, o nome:

1. Define sua identidade religiosa

Por isso foi incluído no nome oficial do movimento em 1931.

2. Diferencia o grupo de outras tradições cristãs

A singularidade do nome reforça a autopercepção de serem “o povo de Deus”.

3. Funciona como ferramenta evangelizadora

Muitas publicações enfatizam que identificar o “nome de Deus” é essencial para a salvação.

4. Sustenta a autoridade doutrinária

A organização afirma ser a única que restaura o uso correto do nome divino.

Contudo, como demonstrado:

**O nome Jeová não tem origem bíblica antiga,

mas origem medieval, não reconhecida pelos massoretas, pelos judeus, nem pela filologia moderna.**

10. Conclusão Expandida

A análise histórica, linguística e documental demonstra que:

  • O nome YHWH é o nome original bíblico.
  • “Jeová” não aparece em nenhum manuscrito hebraico pré-medieval.
  • A forma surgiu por erro de leitura de estudiosos cristãos medievais.
  • A pronúncia mais aceita entre hebraístas é Yahweh.
  • As Testemunhas de Jeová adotaram “Jeová” como elemento identitário, não como reconstrução filológica.
  • A religião é sustentada por uma organização global altamente estruturada, com elementos administrativos corporativos.

Assim, o nome Jeová, embora religioso e devocional para milhões, não tem base histórica como nome original de Deus, e sua defesa por certos grupos deriva de tradição doutrinária posterior, não das fontes bíblicas ou arqueológicas.

 

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